Por Antonio Fernandes
Poderia passar a noite em melancolia
Lembrando do que ja fui
Dizer que rasguei pedaços
De mim
E escrevi com sangue
Da ponta da faca
Poderia dissertar
Da desumanidade
Que este universo que habito
Despejou sobre mim
Injustiças ancestrais
E as varias mortes
Que sofri
Obrigado a continuar vivo
Mesmo que morto
Poderia te lembrar
Do assassinato que cometi
E de quem não está vivo
Por destino
Ou por relapso de minha parte
Um aborto do qual tomei parte
Poderia falar muito do passado
Poderia falar muito do futuro
Dos muitos sonhos
Que sonhei ao lado
De alguns que tanto decepcionei
Poderia te dizer bastante
Dos esforços que fiz
Para derrubar muros maiores que eu
E para construir
Castelos incompletos
Inúteis e despedaços
Dos esforços que tive
Em direção ao nada
Tentando realizar o irrealizável
Tentando cumprir o incumprível
Tentando tornar real muita coisa
Que nao tinha sequer
Menor possibilidade
De viver o real
Tenho sonhado muito
E tenho feito um esforço
Hercúleo
Toda a minha existência
Em direção aos sonhos
E tenho nadado
De braçadas em direção
A África
Numa natação que nunca
Há de chegar
Poderia te perguntar
Se minha loucura é irreal
Se sou eu que nao entendo
Toda a necessidade de tudo isso
Qie tanta gente faz uns com os outros
Eu juro que o universo
Me machuca
Compreendo os desígnios dele
Sigo e traço meu caminho
Sei que sou cria
Da destruição de Shiva
O sempre partido
O sempre quebrado
O que habita sozinho
Os sorrisos largos
De muitos que nao se importam
Sei que nao sou o verdadeiro
Amigo de ninguém
E que sou predestinado
A estar só
E encontrar outros
Em suas trilhas e caminhadas
Apenas quando lhes comvém
Estou lá quando precisam de mim
Quando suas familias morrem
Seus pais lhes abandonam
Quando suas carreiras estão em xeque
Quando precisam formar
Quando precisam amar
Estou lá quando todos passam por provações hérculeas
Me faço a força de muitos
Apenas para ser abandonado
Ultrapassado e deixado
De lado
Em seguida
Poderia dizer muito
Do que queria relizar
Do que ja quis realizar
E de tudo que nunca realizei
Minha vida de mimado
Não foi fácil
Tenho tido muitos
Que me viraram as costas
Muitas vezes
Tenho criado filhotes de hiena
Que me devoram
Os pedaços podres de mim
Quando crescem
Poderia dizer muito
Poderia dizer
Mas rabisco esses versos
Na intenção de que ninguém nunca os leia
Coloco fogo na minha dor
Para carboniza-la por completo
Estarei sorrindo quando me encontrar
Parecerei inocente
Tresparecerei rico
Saudável e lustroso
Vou te dar presentes
Serei amável
Talvez voce jamais saiba
Que desenho árvores mortas
E casas mortas
E pessoas mortas
Sou a sombra da dor
Imponente como uma Roma
Que cai
Aos pés
De Átila
Que se destrói
E que morta
Sobrevive em ruinas
Apenas para contar histórias
Poderia te dizer
Poderia
Poderia