Um Garoto de Aberdeen #7 – Paranóia

Por Antonio Fernandes



Ele bate a porta e ninguém atende.
Bate denovo. Nada
Está começando a pensar se sua mãe não se pendurou na sala quando a porta abre:

-Kurt. – Ela tem um olhar aflito.
Entra na casa procurando alguma coisa errada.
-Mãe o que…

Há um homem barbudo, fedendo a desodorante sentado no sofá.
-Esse é Jason meu filho. Ele é… bem. Ele é meu novo namorado.
-Mas que merda é…
-Filho…
-Tudo bem mãe, foda-se, não precisava substituir meu pai com duas semanas.
-Filho!
-Dane-se! – Sobe as escadas e bate a porta do quarto.

Mike havia esquecido uma garrafa de vodka meio cheia em seu quarto outro dia. Ele nunca havia bebido aquele tipo de coisa. Bebeu umas cervejas uma vez e cuspiu, pensando que tinha gosto de terra, nem imaginava qual era o gosto daquilo.

Não podia passar pela sala, de modo que pulou a janela, o que se arrependeu logo depois. Algo que parecia um martelo acertou sua coluna e doeu horrivelmente, mas se obrigou a não gritar.

Correu, antes que sua mãe percebesse sua ausência. Se mandou pelas ruas com vontade de vomitar de dor e remorso. Um cara daqueles com sua mãe. Um cara daqueles beijando sua mãe, como Polly o havia beijado outro dia. Nojento. Horrivel. Uma música lhe vem a cabeça e parece se encaixar estranhamente ao momento:

Finished with my woman ‘cause she coudn’t help me with my mind!
People think i’m insane because I am frowning all the time!

Tudo bem, talvez não o primeiro verso, mas o segundo sim. Pensou na escola. Pensou em como foi esquisito ver Dolly no outro dia de manhã e como ela ficou envergonhada e fingiu que não o conhecia. Pensou em como estava com raiva o tempo todo e seus colegas já tentavam evita-lo  todo custo. Dane-se.

All day long i think of things but nothing seems to satisfy!
Think I’ll lose my mind if I don’t find something to pacify!

A vizinha rega as plantas e vê o garoto de oito anos passar correndo com uma garrafa de vodka cantando alguma coisa pesada. – “Deve ter pensado que eu sou paranóico” – Pensou – “Talvez eu seja”. Riu pra si mesmo.

Chega no parque. Arranca a tampa da garrafa e bebe de uma vez. Consegue chegar ao segundo gole antes de vomitar. Berra de ódio de sua mãe pelo que fez. – Vadia! Vadia! Vaca desgraçada! – termina novamente com um berro e limpa o gosto de vomito dando uma golada mais segura.

Can you help me!? – Berra a letra da música, chora e bebe denovo – Occupy my brain!? – Vadia!

Tenta se levantar mas não consegue. Tropeça e cai na beirada do lago, encharcando as calças. Dá murros no barro até que a lama ganhe filetes de sangue. Se arrasta pra fora e bebe mais.

Kurt perde as forças – I tell you to enjoy life – deita no chão – I wish I could – Fecha os olhos – but it’s too late –
E dorme.

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